segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

A musa impressionista




O programa de ilustração já estava instalado há alguns meses em seu computador, mas ele ainda não tivera coragem. Vinha reunindo excitação, buscando inspiração nos mais diversos lugares até deparar-se com o momento certo. Esse momento chegara; era hoje, era agora.
Abriu o programa e iniciou os rabiscos na pequena mesa preta que transmitia sua arte da vida real para o computador. Um traço, dois, três, quatro...um esboço, uma forma, um rosto, um corpo, uma alma. Ali, em seu computador, algo se formou, e se formou saído de um lugar inimaginável, se formou ali uma vida oriunda diretamente de sua própria cabeça.
Inseriu naquele computador o desenho da mulher mais linda que já vira até hoje e surpreendeu-se ao terminar a obra  de arte. Ali estava um desenho de dar inveja à gênios impressionistas, ali estava uma obra capaz de arrancar suspiros de Michelangelo’s, Da Vinci’s e outros tantos renascentistas. Aquela era, por certo, uma obra prima em forma de arte; aquela era uma obra prima em forma de mulher.
O realismo era tão grande que ele podia ver seus belos lábios carnudos tremulando conforme sua frágil respiração. Podia perceber os fios de cabelo pretos e ondulados balançando e descobrindo sutilmente seu avantajado busto conforme o vento lhe atingia. Ele podia ver seus olhos grandes e castanhos piscando de segundos em segundos. Por Deus que aquele desenho parecia manifestar um anseio por vida própria, por Deus que aquela era uma obra tão real a ponto de ser...real.

“Puta que pariu, o meu desenho tá vivo!”, ele pensou ao perceber que não fora o efeito do uísque, nem do pequeno cigarro que acabara de enrolar em papel seda. Aquela mulher do desenho estava viva e manifestava toda sua vitalidade através de belas e singulares piscadas sensuais e objetivas.  
Ele perguntou, com receio e com voz trêmula:

- Tu...tu...está viva?
- O que mais tu esperava. Tu não me criou para ser uma companheira? Não me desenhou para ser mais real que qualquer obra impressionista? Voilá!, a tecnologia a teu favor, bebezão.
- Bebezão? O que é isso, eu criei uma obra de arte que se expressa em francês e me chama de bebezão?
- Eu sou o claro e manifesto desejo da tua mente. Vim para dar significado a tua vida e te encher de euforia. Vim para te mostrar que a vida é muito mais do que cinco dedos. Vim te mostrar que a vida é mais do que meia dúzia de sites pornôs que te alegram todos os dias. Vim ser teu gozo, vim ser teu sexo, vim ser tua musa...acima de tudo, vim ser tua mulher.
Ele não podia entender. Não era possível que aquilo estivesse realmente acontecendo. Um desenho não poderia derramar-se à vida assim e ele considerava-se insano ao conversar com a tela de seu próprio computador. Eis que, como num passe de mágica, ou numa obra de Gogol, ele não mais precisou falar com o computador. Aquela bela mulher desenhada saiu de dentro de seu pequeno lar como quem pula uma janela e, graciosamente, vai ao encontro do namorado de colégio.
Ela estava ali, virada em sensualidade, lábios e busto, bem na sua frente, pronta para dar a ele todo o prazer que em seus 25 anos de vida não tivera. Direto de sua mais cálida e terna imaginação...oriunda das profundezas mais libidinosas do seu ser, ali estava a ama do seu tesão.
A conversa não se estendeu por mais um segundo sequer, pois ela foi logo lhe abrindo o cinto, o zíper, e acalentando seu membro timidamente rijo entre os lábios, demonstrando o quanto entendia o que estava fazendo e dando-lhe prazer como só um personagem criado por ele mesmo poderia dar.
Foi a noite mais linda de sua vida. O prazer jorrou-lhe o corpo todo, uma, duas, três, quatro vezes. Depois de tudo, ela lhe tagarelou. Contou-lhe da vida curta, falou-lhe de seus problemas, contou da desgraça que era estar presa na imaginação, falou que por vezes estapeou-se com personagens de jogos de vídeo games que insistiam em roubar-lhe o lugar nos pensamentos dele. Falou-lhe do tanto que achava a mãe dele chata, falou – mal – sobre o time dele...falou, falou, falou...
Ela falou tanto que o fez entender que, por vezes, há desejos que não devem sair da mente. Ela falou tanto que o fez entender que mesmo a melhor (e única) noite de sexo de sua vida pode se fazer pequena ao lado da tranquilidade de sua mente. Ela falou tanto a ponto de deixar-lhe claro que há pensamentos que, por mais que estejam dentro de nossa cabeça, não devem jamais ser levados a cabo.
Enquanto ela falava, ele vagarosa e sorrateiramente esgueirou-se até o computador, iniciou o programa de ilustração, selecionou a borracha e pouco a pouco o silêncio se fez.

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