segunda-feira, 7 de maio de 2012

O Estranho Caso do Monza 1985

Capítulo I


- Agora não dá mais! Vou descobrir quem foi, Rita, ou não me chamo Marco Antônio – declarou ele pra lá de resoluto, não deixando margem para qualquer dúvida. Aquela era a voz de um Marco Antônio que não levaria desaforo para casa, sabia Rita.

- Calma, Toninho, não precisa ficar tão nervoso. Vamos pensar calmamente, tenho certeza que dentro da racionalidade acharemos uma solução – tentou amenizar a Rita.
- Racionalidade uma ova, Rita de Cássia, eu preciso de uma explicação e preciso mais, preciso acertar um belo de um murro na cara do infeliz que estragou o melhor pedaço da minha vida.
- Melhor pedaço da sua vida, Marco Antônio Souza Albuquerque? Pensei que eu fosse o melhor pedaço da sua vida.
- T...ta Ritinha, eu não quis dizer isso, mas bem sabes o quanto sou apegado naquele Monza 85, modelo único e todo original. A pintura dele é totalmente cromada e sem qualquer dano... até agora. Eu pego o desgraçado que fez isso e nem sequer me deixou um bilhetinho ou me deu um telefonema pedindo desculpas.
A Ritinha concordou que o Marco Antônio não estava tão errado, afinal de contas, ela sabia o quanto o Monza 85 significava para o marido, afinal de contas, fora nele que os dois saíram da festa de casamento para a lua-de-mel. Fora naquele Monza 85 que rabiscaram em batom os clássicos dizeres “recém casados” e “felizes para sempre”.E não só isso, também fora naquele Monza que ele a buscou pela primeira vez e a levou para ver o então lançamento “De Volta Para o Futuro”. Naquele Monza deram o primeiro beijo, e no mesmo Monza rolou a primeira passada de mão e o primeiro clima quente. Aquele carro queria dizer muito não só para ele. Era para eles, queria dizer muito na vida do casal, e agora, alguém havia batido na porta do carona e estragado boa parte da pintura original, enquanto o carro estava parado no estacionamento do subsolo.

- Tá legal Toninho. Senta aqui, vamos estudar as possibilidades. A marca do raspão na lataria é preta, não é? Então vamos ver quem são os proprietários dos carros pretos e depois conversamos com todos eles, mas de um modo ameno e civilizado. Combinado, meu amor? -impôs a Rita, sentando-se à mesa, com aquela voz que por si só dispensava qualquer concordância, o Marco Antônio sabia que estava fadado apenas a concordar com o que fora dito, afinal de contas era sempre assim, ela sempre tinha razão.

Começaram os estudos, e o primeiro nome ao qual chegaram não deixava dúvidas, não poderia ter sido outra pessoa que não ele, o Seu Tavares do térreo. O velho não tinha menos do que 350 anos, dirigia um Opalla 1974 preto como carvão, e todos sabiam: era um tremendo maneta.
-Rita, não me diz nada e nem me segura que eu vou estapear a cara daquele velho sem vergonha, até ele confessar que foi ele. É isso que vai acontecer, vou encher aquele velho de bofetada, e ele vai me dizer...
- Marco Antônio, senta aí! (voz de comado da Rita).
O Marco Antônio sentou, com só haveria de ser.
- Vamos os dois juntos até a casa do Seu Tavares e perguntar se ele, por ventura, não lembra de ter acertado alguma coisa quando saiu com aquela banheira dele da garagem, Tônio.

Acertou-se então que o Marco Antônio iria sozinho, mas que se a Ritinha ouvisse gritos e suspeitasse que o velho estava sendo agredido, ela desceria até o térreo, pegaria o Marco Antônio pela mão e as investigações terminariam ali, e ele que não se surpreendesse se ela vendesse o carro no dia seguinte.

Cada degrau que o Marco Antônio descia rumo ao térreo era marcado pelo toc-toc da batida de seu mocassim de sola de madeira no soalho. Ele não fazia questão de esconder que era um homem zangado e todos sabem como anda um homem zangado, ele anda fazendo toc-toc, isso é público. Quando chegou ao térreo os toc-toc não cessaram até chegar todo empertigado e cheio de si ao apartamento do velho Tavares, quando chegou lá: toc, toc, toc, bateu na porta.

O velho abriu a porta e pareceu assutado quando viu o Tonhão ali. Talvez assustado não fosse a expressão mais correta, ele pareceu perturbado e o nosso Sherlok Holmes contemporâneo percebeu isso. Tavares tentou fechar a porta rapidamente, porém, o Marco Antônio esperava esse isso do velho e usou toda a sua força para impedir o movimento. Contou também com a ajuda do tempo, afinal de contas, com suas centenas de anos o velho levaria uns 32 minutos até conseguir fechar totalmente a porta.
- Querendo esconder alguma coisa, Seu Tavares?

Continua nos próximos capítulos (dessa vez é de verdade).
Agradeço ao incentivo do grande escritor e não menor contador Cristian Schnidger.

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