segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

A triste história de Dias Passados



Aquele sujeito vivia ontem. Não que vivesse especificamente no dia de ontem, mas vivia sempre no que já passou. Caminhava na rua com a certeza de manhãs que já se foram, esperando por outro sol que não o de hoje. Pensava na beleza da chuva de outro dia e fugia sempre da chuva do presente.
Tinha por nome de batismo Dias Passados e fazia jus a tal graça.

Seu coração batia um tanto atrasado, e seus olhos desconjuntados jamais olhavam para frente; tinham, por hábito, estar sempre voltados para o lado esquerdo, com se quisessem ver algo que já passou. Tinha complicações em função disso, mas nunca podia ir ao médico, pois o maldito doutor atendia apenas no dia de hoje e hoje ele não queria.

Dias Passados era um sujeito pra lá de peculiar, pois pra ele nada poderia ser feito hoje, tudo deveria ter sido feito no que já passou e aí, quando ele olhava pra frente ou pro agora, nunca havia feito nada no ontem. Era óbvio para qualquer um – menos para Dias Passados – que quando não se vive o presente não se tem histórias para contar no futuro.

E ninguém pode dizer que ele não tentou. Dias Passados tentou, certa feita, olhar pro agora. Foi quando conheceu uma bela senhora, que o fez tentar esquecer do passado. Tentou o fazer viver no agora, porque decretou que ou era isso, ou ele não a teria. Dizem que mulheres mudam a cabeça de qualquer homem, pois qualquer homem no fim das contas apenas procura por uma bela mulher que o conforte em dias difíceis e que o afague e o esquente entre os seios nos dias de frio.

Durante uma semana, duas semanas e até três semanas deu certo. Até os olhos tortos voltavam de pouco em pouco para o lugar. Houve, contudo, um problema. Nos primeiros dias o sexo era fantástico, com direito a inúmeras variáveis e a um desempenho digno de filmes eróticos. Porém, o passar dos dias foi amuando Dias Passados, foi tornando-o incompetente, primeiro, insuficiente depois, e impotente por fim. Uma única explicação bastava para justificar o caso: para ele, o que acontecia ontem era sempre melhor.

A adorável senhora deixou Dias Passados, como todos deixam seus dias passados para trás, ou como todos deveriam deixar. No fim das contas, não foi só ela que o deixou. Seus amigos não aguentaram e o deixaram, seus colegas não aguentaram e o deixaram. Os parceiros do futebol não aguentaram mais o Dias Passados com sua camiseta de um clube que já passara, errando gols atrás de gols, sempre porque a bola chegava antes, e o deixaram.

O mundo não se preocupava mais com Dias Passados. Todos o esqueciam, mas ele seguia perdido em meio a um mar de pensamentos...pensamentos esses de coisas que já haviam passado, pois para aquele único sujeito, os dias que passaram seriam eternamente melhores dos que os que ainda virão.


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