Aquele
sujeito vivia ontem. Não que vivesse especificamente no dia de
ontem, mas vivia sempre no que já passou. Caminhava na rua com a
certeza de manhãs que já se foram, esperando por outro sol que não
o de hoje. Pensava na beleza da chuva de outro dia e fugia sempre da
chuva do presente.
Tinha por
nome de batismo Dias Passados e fazia jus a tal graça.
Seu
coração batia um tanto atrasado, e seus olhos desconjuntados jamais
olhavam para frente; tinham, por hábito, estar sempre voltados para
o lado esquerdo, com se quisessem ver algo que já passou. Tinha
complicações em função disso, mas nunca podia ir ao médico, pois
o maldito doutor atendia apenas no dia de hoje e hoje ele não
queria.
Dias
Passados era um sujeito pra lá de peculiar, pois pra ele nada
poderia ser feito hoje, tudo deveria ter sido feito no que já passou
e aí, quando ele olhava pra frente ou pro agora, nunca havia feito
nada no ontem. Era óbvio para qualquer um – menos para Dias
Passados – que quando não se vive o presente não se tem histórias
para contar no futuro.
E ninguém
pode dizer que ele não tentou. Dias Passados tentou, certa feita,
olhar pro agora. Foi quando conheceu uma bela senhora, que o fez
tentar esquecer do passado. Tentou o fazer viver no agora, porque
decretou que ou era isso, ou ele não a teria. Dizem que mulheres
mudam a cabeça de qualquer homem, pois qualquer homem no fim das
contas apenas procura por uma bela mulher que o conforte em dias
difíceis e que o afague e o esquente entre os seios nos dias de
frio.
Durante
uma semana, duas semanas e até três semanas deu certo. Até os
olhos tortos voltavam de pouco em pouco para o lugar. Houve, contudo,
um problema. Nos primeiros dias o sexo era fantástico, com direito a
inúmeras variáveis e a um desempenho digno de filmes eróticos.
Porém, o passar dos dias foi amuando Dias Passados, foi tornando-o
incompetente, primeiro, insuficiente depois, e impotente por fim. Uma
única explicação bastava para justificar o caso: para ele, o que
acontecia ontem era sempre melhor.
A
adorável senhora deixou Dias Passados, como todos deixam seus dias
passados para trás, ou como todos deveriam deixar. No fim das
contas, não foi só ela que o deixou. Seus amigos não aguentaram e
o deixaram, seus colegas não aguentaram e o deixaram. Os parceiros
do futebol não aguentaram mais o Dias Passados com sua camiseta de
um clube que já passara, errando gols atrás de gols, sempre porque
a bola chegava antes, e o deixaram.
O mundo
não se preocupava mais com Dias Passados. Todos o esqueciam, mas ele
seguia perdido em meio a um mar de pensamentos...pensamentos esses de
coisas que já haviam passado, pois para aquele único sujeito, os
dias que passaram seriam eternamente melhores dos que os que ainda
virão.