sábado, 30 de maio de 2009

O roubo do sofá (parte 1)

Primeiro Capítulo
Tudo no Sereia

Alguma coisa acontece quando se chega a Arroio Teixeira. Seja o sol, a areia, o mar, as pessoas, o infinito, ou até o vendedor de milho que perambula pela abarrotada e estreita faixa de areia texana, durante o verão. Fato é que o lugar é mágico, místico, iluminado, cabalístico. O que ao certo se sabe, é que não há como ir à Arroio Teixeira sem viver uma história pulsante, isso, pulsante é a palavra certa.
Assim, lembro-me vagamente de situações que vivi em determinadas praias, porém, nenhuma brilha tão claramente em minha absorta mente juvenil, quanto as lembranças dos verões texanos. E foi lá, posso assegurar, que foi lá, que tudo aconteceu, foi lá, que o crime dos crimes, o terror dos terrores aconteceu. O Roubo do sofá da tia Rosmarie.

Era pouco mais das 21h, aliás, era muito mais das 21h, penso eu que já deveria ser algo entre 23h, e eu estava no badalado(até então) bar Sereia, à beira mar Teixeirense. Tranqüilo que estava, bebericando, - que adoro usar a palavra bebericar –discursando, diria quem sabe filosofando sobre qualquer coisa que o ambiente praiano pudesse proporcionar, se a memória não me falha, sobre os seios da Monalisa. Ah sim! Os seios da Monalisa, eram um espetáculo...

Suspeito 1: Monalisa Centero; 21 anos, solteira, balconista do Sereia Bar. Ambiciosa, sexy, e acima de tudo, louca, absolutamente louca por bis branco.

...se faziam presentes, serelepes, firmes e extremamente decotados toda e qualquer vez que pedíamos mais uma rodada de cerveja. Definitivamente, AT (me dei ao direito de abreviar), têm um algo mais em seus ares.
A visão dos seios de Monalisa me desviaram do assunto principal, o crime, o horrendo crime,começou a se desenvolver quando dona Denise, atravessou o espaço o bolicho aos gritos de, “safada, safada, aquela Rosemarie. Ela me paga, ninguém mexe comigo”.

Suspeito 2:Dona Denise: Sócia-proprietária do Sereia Bar, 56 anos, viúva, passado obscuro, e acima de tudo irrevelável. Rixas antigas já foram registradas entre a vítima e a referida pessoa. Em sua ficha criminal, Denise tem apenas um registro, no Revellion de 85 quando fora detida dirigindo um trator (sabe-se lá de quem), despida e alccolizada.

Nossa atenção foi detida à ela por alguns minutos, Denise parecia enlouquecida, algo de muito ruim tinha acontecido, não fazíamos a menor idéia do que, porém, tínhamos certeza de que a história não pararia por ali, Dona Denise é vingativa, e isso explica muita coisa.

A noite ia chegando ao seu fim, até por que já estávamos pra lá de alcoolizados, e sem nenhuma condição para debater, encenar, filosofar, quanto menos desvendar crimes que ainda estavam por ocorrer. Refiro-me a estávamos, pois além de mim, encontravam-se no local, Ari, meu velho e bom amigo, com faro e tino investigativo; Hermenes, que apesar do nome é um galanteador de primeira; e Teixeira, um senhor de idade, conhecedor de todas as ruas do vilarejo, dizendo-se inclusive ser descendente do Velho Teixeira, fundador da praia.

Encaminhávamo-nos para nossas respectivas casas, que não eram longe, nem de onde estávamos, nem umas das outras, inclusive por que as casas em AT não tem como serem distantes. Quando ouvimos o latido do Hitler, o cachorro da tia Rosemarie. Em seguida, vem ela, saltitando e esbravejando em seus esganiçados gritos: “Meu sofá, meu sofá, meu precioso sofá”

Continua nos próximos episódios.

terça-feira, 26 de maio de 2009

As torres, meu vinho...aos Gaúchos



Meu pai, vez que outra me convoca para uma comedida, analisada e derradeira partida de xadrez. Enxadrista que sou, aceito, e a jogatina começa. A partida é um plano de fundo para debates, assuntos das mais diversas estirpes são discutidos e analisados sob o embalo um bom vinho seco.
Em geral, os peões se digladiam enquanto falamos sobre o futebol. É claro, qual seria o assunto senão futebol: - Pra mim, o Tcheco é volante. Tem habilidade pra passar a bola, inteligência, e não é afoito – digo eu após os primeiros combates no tabuleiro.
-É filho, agora me diz, quem vai dar velocidade ao nosso contra-ataque? Quem vai pensar a jogada ali na frente, se o Tcheco ta na volância?
- Ta certo, Tcheco é meia. Tudo ficou claro.
Perco meu peão.
O futebol decorre, até dos peões sobrarem cinzas, e entrarmos definitivamente na zona de combate, na área de perigo, o jogo centraliza-se e cada erro pode custar uma vida. A conversa não é diferente, conforme aumenta o grau hierárquico do jogo, aumenta o tom e a importância da discussão.
Entramos na política, e mais vinho!
- O Lula! Esse sim tem me decepcionado, onde está aquele trabalhista? Onde foi que ele escondeu o metalúrgico que ele tinha em si? Pra mim, virou um humanista- vocifera meu pai.
- Eu já tinha te alertado quanto á isso. Pra mim, quem não investe em educação e quer dar tudo pronto ao povo, não merece muitas honras.
- Saudade do Brizola! (meu pai)
- Saudade do Brizola! (eu)

Ai, perdi minha torre. Meu hoque se foi, sem minha torre, meu tradicional sistema de defesa, meus três zagueiros, foi destruído. A raiva começa a irromper no meu ser, o clima começa a se alterar. Meu pai, olha-me com o queixo ereto, um sinal de superioridade, ele sabe que está em vantagem, e deve pensar: “eu que te ensinei a jogar isso, vou ser teu eterno carrasco”.
O jogo segue, eu já nem dou muita bola para a conversa, quero ganhar, porém, meu pai, puxa outra vez um assunto interessante:
- Se Bento não tivesse feito o que fez, seríamos um povo sem caráter.
- Nem ele acreditava na revolução,pai.
- Mas a fez, o que comprova a fibra do nosso povo.
Levantamo-nos e em uníssono cantamos: “Povo que não tem virtude acaba por ser escravo”. As taças tilintam no ar. UM BRINDE AOS GAÙCHOS!
Surpreendi meu pai, levei o bispo dele. A-ráá, as coisas estão começando a mudar, hein?!
Não lembro-me se fiz essa pergunta á ele, sei que se não à fiz, ele deve ter decifrado meu olhar, por que ao mesmo instante ele derrubou meu cavalo, e olhou-me, desafiador.
A conversa era interessante, o jogo derradeiro, e o vinho... “mais vinho, pai”...era ótimo.
Tudo conspirava para um bela noite entre pai e filho. Mas não, eu não pretendia perder. Sabia que a derrota era eminente, mas não sou assim de me entregar, ta na minha história, se desistisse tão fácil das coisas, não seria do povo que sou, muito menos torceria para o time que torço.
-Aos gregos – diz meu pai, mais uma vez levantado a taça para um brinde, quando começamos a debater as teorias de Platão.
- Aos gregos- eu repito, com o mesmo movimento.
Minha rainha se foi, estou de luto. Meu pai me deixou apenas o Rei. Sou bravo, não vou desistir. Corro com o rei para um lado, para o outro. Enfim, ele me olha, com a expressão de quem me ensinou, e diz: - Xeque...mate.
Realmente, meu pai me ensinou.
Conversas assim, são agradabilíssimas. As tenho com a minha mãe também, mas sem o xadrez, que ela não gosta de jogos, e sem o Tcheco, que ela nem sabe quem é. Porém, conversamos. E como é bom conversarmos com quem sabe mais da vida do que a gente.
Todo e qualquer ser humano tem uma história pra contar, do catador de papel, do porteiro do teu prédio ao prefeito da cidade, ao mais importante empresário do município. Cabe a nós ouvir, com sabedoria, criando assim, um infinito leque de possibilidades e conhecimento.
Espero, que com tudo o que já aprendi, e com tudo que tenho certeza que vou aprender, eu vença a partida de xadrez da minha vida. Que eu perca as peças pelo caminho, por que isso a isso já me acostumei. Agora, o xeque-mate, esse quem me dá, é só o meu pai.

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Tu é a Noêmia

Sabe a Noêmia? Já devo ter falado dela, aquela que dizia sempre a famosa frase: “se Deus não quis, é por que não era pra ser".Ta, se não contei, presta atenção ai, caro companheiro, por que vale a pena.
A Noêmia namorou um amigo meu, o Gláucio. Os dois se conheceram numa ambulância, mas outra hora eu conto a história. O que acontece é o seguinte. O Gláucio é um rapaz meio violento. Não que ele seja agressivo, não é isso. Mas ele é um pouco nervoso, acho que explosivo é a palavra certa. Isso, Gláucio explosivo. Pois bem, a Noêmia era crente, mas crente mesmo, de carrega bíblia embaixo do braço, e abanar bandeirinha em Corpus Cristi.
O Gláucio, pobre desgraçado, trabalhava demais, estava sempre estressado e descontava a sua raiva do chefe, em casa, na Noêmia, ou no hamster Hamtaro. Xingava, esbravejava, esbofetiava o ar, enquanto manchava com ofensas a pobre alma imaculada da Noêmia.
Noemia, depois de ouvir todas as lamúrias do seu homem, bradava, ainda que com os olhos baixos, e a insegurança na voz: “Meu bem, se Deus não quis, não era pra ser”.

Não me esqueço disso. Mas não é que não me esqueça por que a história é interessantíssima, ou me marcou uma época da vida. Não, não me esqueço dessa história, por que cada um de nós, cada um dos brasileiros, sim, até mesmo você, que ta ai sentado lendo esse texto medíocre, até mesmo tu tem a Noêmia no teu âmago.
Falta-nos vergonha na cara, falta-nos voz ativa perante à corrupção que nos é imposta, falta-nos imponência para apontarmos o dedo na cara daqueles que pensam que somos estúpidos e inferiores, e dizer-lhes, “olha aqui, eu não sou Noêmia"!
Quer uma triste notícia? Mas triste mesmo. O argentino é assim, o argentino não se omite, é bem verdade que as coisas também não andam as mil maravilhas com os hermanos, mas de todo modo, eles levantam o queixo e o nariz e dizem, “nossotros somos los mejores”, claro, só eles acreditam nisso, mas já é o suficiente.
Ta marcado, meu ilustre leitor, brasileiro é povo festeiro, é solidário, animado, porém, ouse o senhor discordar que a Noêmia não ta ai dentro! Ta vendo, não ousou, tu não duvidou de mim, tu não quis saber de discussão, tu baixou a cabeça ,humildemente, e disse: “ta bom, mas se Deus não quis, é por que não era pra ser.